A Mãe edifica sua casa

 

 

Em frente ao seu sorriso, escrevo. Numa linda foto está ele aqui, ainda mais lindo, posto em frente ao meu computador. Um porto seguro. Um olhar de mãe como não há em outro. Você, que, de tanto sonhar, construiu um sonho por toda a vida. Realizou. E o faz desde a época em que dormia sobre folhas de bananeira até hoje, quando aos beijos nas gôndolas de Veneza. Construiu todo um mundo só seu. Edificou uma casa, uma família, um oceano de amor que existe em decorrência disso. Tudo, absolutamente tudo, porque você edificou. Sozinhos, você e seu companheiro. (…) É que, no final das contas, a mulher sábia edifica sua casa. E aqui, minha querida Mãe, quero homenageá-la por ter seguido os ditames divinos. Construiu-nos. Fez-nos ser quem somos. E aqui, em frente ao seu sorriso, escrevo. Por ti. Pelo seu dia.

Feliz Dia das Mães.

O Abraço

 

 

Acabo de receber um dos abraços mais marcantes de toda a minha vida. Um abraço de mãe, de mamãe, da minha querida mãe. Senti-me há pouco como se habitasse um novo mundo, envolvido pelos braços de quem amo e sobre um colo tão confortável quanto aqueles em que meus pais me receberam pela primeira vez, ainda bebê. (…) Acabo de ser tomado por uma sensação sublime, incomum e rara, do tipo que, por conta do mundo contemporâneo e suas novas configurações, experimentamos somente em momentos especiais. E, ¿quer saber?, o sentido da vida — a felicidade, o ser-feliz — coube ali, num abraço. Aquele Abraço.

Em retrato, os olhos se fecham como se a Terra não fosse ambiente suficiente para suportar tamanha intensidade, tão forte luz. Os tímpanos deixam de vibrar para que o corpo, tomado por um extraordinário sentido não-científico, possa reverberar energia ao invés de sons. Os corpos, ainda que guardados à sombra de roupas vendidas sob a superfície deste mundo, transformam-se num, somente um. Lágrimas brindam o encontro para que se refresquem os fervores do sentimento, ou talvez porque simplesmente simbolizam o pranto, aquela reação natural decorrente óbvia de tal sensação e típica da máquina humana. (…) Enfim, um abraço. O Abraço.

Ligação, união, demonstração de afeto e amizade. Amplexo. (…) Tão logo se foi e passei a pensar sobre os possíveis motivos pelos quais não abraçamos. Pois abraçamos com menos intensidade a qualquer momento, qualquer coisa, mas não abraçamos de verdade. Porque o abraço — o verdadeiro — é assim que se dá. Porque o abraço — o marcante — só se dá assim. E, assim, pouco importa o porquê de ter se dado. E quando imagino, então, o motivo pelos quais não abraçamos, fico a ver navios, não chego a conclusão alguma. E a imaginação fica assim, triste, a questionar: ¿por que não abraçamos? ¿por que não viver, agora, a sensação que nos remete à felicidade? ¿por que precisamos de motivos?

Acabo de receber um dos abraços mais marcantes de toda a minha vida. Um abraço de mãe. Acabo de entender também que a felicidade está aqui, ali, bem perto, e se mostra singela como num aperto sincero. Simples. Basta somente que meus braços estejam dispostos. E os seus. E também os braços dele. Os braços dela.

Abraços.

O Suporte

 

 

Será deslumbrante o dia em que sua biografia, ainda que em poucas páginas, for editada e publicada. É comum vê-la verbalizar sobre tal vontade. Não porque ela a queira exposta às milhares de pessoas que, gratuitamente ou não, poderiam se apossar da obra e entender como toda sua bela vida fora minuciosamente bem vivida. Deslumbrante, sim, seria porque, na visão dela, somente aí ela deixaria o legado; somente publicando sua biografia a vida faria sentido aos outros. Aliás, esse talvez seja, depois de tudo viver, o maior sonho de minha querida Mãe. Hoje, em plena comemoração de seus 63, exponho aqui minha humilde posição sobre tal fato.

Ao lado de casa, já há alguns meses, estão construindo um prédio. Quiçá terminem em tempo. Digo porque, como se sabe, o trabalho árduo do construtor está no início da obra, momento em que aqui infelizmente ela se encontra. Os operários, ali, precisam de paciência; os vizinhos, pobres vizinhos, mais paciência ainda. As máquinas que perfuram o solo são barulhentas e param somente porque os funcionários precisam manter suas necessidades fisiológicas em dia. Nesta fase, porém — e é justamente este o argumento que me permite compreender os tuntuns — , operários estão a construir aquilo que, no futuro, dará sustentação ao prédio: o suporte. (…) E, reflitamos, se, por obra do acaso ou da incompetência do malformado engenheiro, o prédio não se apoiasse sobre um suporte, nada seria. Como um palito, que não pára em pé quando não está fincado num pedaço de carne ou queijo, o prédio ficaria  a cambalear a qualquer condição. Cairia, decerto, quando atingido por fortes rajadas de vento, ou nem tão fortes assim, ultimamente bastante comuns aqui em Guarulhos. Não seria, portanto, um prédio, mas todo entulho.

Muito embora haja íntima afeição entre mim e a ideia de vê-la plantada à frente da tela de um moderno computador escrevendo tal biografia, meu sentimento acerca dessa vontade que ela tem de publicá-la é de repúdio. (…) O prédio não se vende pelo suporte ou, entende-se melhor, pelo buraco que o sustenta, mas por tudo aquilo que é construído sobre tal buraco. Vendem-se os apartamentos, suspensos, mas não se vende o buraco. Aliás, não se vende sequer o porão que se constrói naquele pedaço; muito pelo contrário, enche-se de carros e poeira. (…) Minha querida Mãe é o suporte da família.

Ficaríamos aqui, a cambalear, se ela não estivesse presente. E cambalearíamos quando a falta de paciência tomasse conta do ser, quando o bom arroz e feijão materno nos faltassem ou quando, ainda que por um lapso, deixássemos de entender que a família, sob a égide da mãe, é a base que sustenta todo o resto. E é assim que funciona com Odorica Aureliana Girarde, minha querida Mãe: está a todo o momento, paciente como só ela, equalizando o patriarca, suportando tudo e todos como a pedra fundamental de uma obra. Sua serenidade, poucas vezes quebrada, é que dá o tom. Seu legado, aí sim, aparece sob a forma de um importante papel.

Se não pelo duvidoso lucro com as vendas, minha mãe não precisa de uma biografia editada e publicada. Aos 63 anos, completos hoje, ela pode se encher de orgulho, o bom, ao dizer que, sim, sustenta todo o amor necessário a uma família. E o faz como todo trabalho que se emprega antes da construção de um prédio; ela o faz como toda boa e exemplar mãe. Seu legado e seu sorriso, esses sim, não morrerão em nossos corações. E que dure por anos e mais anos, assim como duram os patrimônios históricos  que há tanto tempo estão por aí, em pé, fincados sobre (…) um suporte.

Obrigado, amada Mãe. Feliz aniversário.

Eu te amo!

Carta aos Pombos

 

Luzinete nasceu em Pernambuco, onde conheceu Nê, ainda bem novinha, com quem se casou. Tiveram Renata, filha única da família que, como muitas da região, também sonhava com uma nova vida. Resolveram, então, que viriam à cidade grande (…) e assim o fizeram: o pai antes, Lu e sua filha tempos depois.

Guarulhos acolheu a família. Bem da verdade, Nê passou a trabalhar em padarias de bairro; Lu, em casas de família. Entre umas, outras, pães quentinhos e cozinhas arrumadas, Renata cresceu. E cresceu junto aos pais – um lindo casal –, em ambientes de carinho e amor.
1996 foi um ano diferente. Numa casa grande, fincada na região central de Guarulhos, Odorica e Odair precisavam de auxílio. Cynthia e Willian, adolescentes pestinhas, bem pareciam com furacões quando adentravam à casa. Mochila e roupa de escola no chão, almoço à mesa e muita bagunça! Luzinete, então, viveu uma reviravolta em sua vida profissional. Renata tinha 8. E Lu, mulher corajosa, aceitou a proposta de trabalho.

À luz daquela época, Luzinete andava quatro quilômetros a pé, deixava Renata no internato Irmã Celeste e partia para o árduo trabalho. Ao fim do dia, voltavam juntas para casa (…) também a pé, eram mais quatro quilômetros. A mãe trabalhava e, por vezes, Renata também. Ainda pequena, cuidava do jardim com o saudoso Vô Ernesto. Bons tempos.

Desde então Luzinete passou a fazer parte da família, e Renata também. 15 anos se passaram e um tantão de coisas aconteceram: Cynthia foi para Minas Gerais, Willian se tornou professor, Odorica transformou toda a casa e Odair trocou de carro; Nê continuou palmeirense e sua filha já é uma mulher.

Renata nasceu em Pernambuco, onde não conheceu Hildebrando. Conheceu em Guarulhos, onde vão se casar. Em Guarulhos as duas famílias de Luzinete cresceram (…) e em Guarulhos mais uma está prestes a nascer: a família de Renata e Hildebrando. É também em Guarulhos que a família Girarde ainda mora (…) e daqui, bem pertinho, Odair, Odorica, Willian e Cynthia continuam a torcer para que Luzinete, Nê, Renata e Hildebrando sejam FELIZES PARA SEMPRE (…) “na alegria, na tristeza, na saúde ou na doença”.