Amor à moda antiga

 

Amor à moda antiga

 

O texto abaixo foi escrito por mim, pasme!, no dia 25 de dezembro de 2003. Eu o escrevi num blog feito para uma namorada da época e que [nem sei como] ainda está no ar: clique aqui. Terminamos o namoro um ou dois anos depois porque eu era bastante imaturo para vivenciar um bom relacionamento naquela época, aos 22. Hoje, dizem, ela está feliz e merecidamente muito bem casada, de modo que seria uma afronta expor o texto, aqui, nos mesmíssimos moldes em que escrevi na época. Fiz poucas adaptações:

Como hoje é dia 25 de dezembro, poderia escrever páginas e páginas para falar sobre como foi a noite de Natal ou onde estarei durante os últimos dias do ano. Ao contrário do que provavelmente você pensava quando acessou o ViverFeliz (nome do blog na época), estou aqui para expressar um dos sentimentos mais bonitos e complexos que já conheci. Na verdade, eu não o conheço completamente (e provavelmente nem conhecerei), mas estou vivendo e a cada dia aprendo mais sobre seu significado: o AMOR.

Durante a última semana, numa carta que escrevi para um amigo, usei um dicionário. Farei o mesmo aqui para demonstrar a complexidade desta palavra que está mudando minha vida e o quanto ela pode ser importante para a evolução de qualquer indivíduo.

De acordo com o Novo Aurélio, “amor” é “um sentimento de dedicação absoluta de um ser a outro ser; afeição, amizade, carinho, simpatia, ternura, zelo” e até (acreditem!) “um doce-de-coco”. Sem dúvida, uma definição rápida, clara e muito complexa. Além de sábio, o velho Aurélio prova também, por ter definido “amor” de maneira tão perfeita, que era uma pessoa experiente. Experiente porque percebi neste ano que para sentir o amor é preciso viver o amor, e para vivê-lo é necessário encontrar em alguém tudo que a tal definição enumera: afeição, amizade, carinho, simpatia, ternura, zelo, o sabor do doce e da dedicação absoluta. Pense bem… É muito complicado!

Digamos que, numa escala de 0 a 10, se é que podemos fazer isso, o amor é nota 10 nos quesitos “exigência” e “complexidade”. É difícil acreditar que todos estes substantivos abstratos e um doce-de-coco possam se juntar num só sentimento concreto, mas felizmente acontece. Afirmo porque “amor de verdade” deve obrigatoriamente possuir, juntos, todos os substantivos citados, suas complexidades, etc… senão é somente atração ou paixão daquelas que vão e voltam na vida dos que procuram algo sério. (…) Ela torce por mim. Torço por ela. Ela conta os segredos dela para mim. Eu conto os meus para ela. Tento dar conselhos para a resolução de problemas da vida dela. Ela me dá ótimos conselhos para a resolução dos meus. Eu sei tudo que se passa pela rotina dela. Ela me liga avisando que estou atrasado. Todos os dias desejamos um ao outro uma ótima noite de sonhos… e muitas outras coisas. “Pequenas” coisas que nos estimulam a brigar pelo bem, a fazer o melhor, a persistir no que pode dar certo (…) e que nos fazem crescer como pessoas.

Divertido é pensar que minha postura em relação ao amor não mudou nos últimos 10 anos. E pelo jeito pouco vai mudar. (…) Faria tudo de novo. Aliás, farei. Farei um blog só para ela, torcerei por ela, contarei todos os meus segredos para ela, darei ótimos conselhos, compreenderei a rotina dela e, sobretudo, desejarei a ela, todos os dias de minha vida, uma ótima noite de sonhos. (…) Não será a namoradinha da época, tudo bem, mas Ela — a minha amada — ainda está por vir. Está, eu sei.

(…)

Bom, se Deus quiser. =)

O Suporte

 

 

Será deslumbrante o dia em que sua biografia, ainda que em poucas páginas, for editada e publicada. É comum vê-la verbalizar sobre tal vontade. Não porque ela a queira exposta às milhares de pessoas que, gratuitamente ou não, poderiam se apossar da obra e entender como toda sua bela vida fora minuciosamente bem vivida. Deslumbrante, sim, seria porque, na visão dela, somente aí ela deixaria o legado; somente publicando sua biografia a vida faria sentido aos outros. Aliás, esse talvez seja, depois de tudo viver, o maior sonho de minha querida Mãe. Hoje, em plena comemoração de seus 63, exponho aqui minha humilde posição sobre tal fato.

Ao lado de casa, já há alguns meses, estão construindo um prédio. Quiçá terminem em tempo. Digo porque, como se sabe, o trabalho árduo do construtor está no início da obra, momento em que aqui infelizmente ela se encontra. Os operários, ali, precisam de paciência; os vizinhos, pobres vizinhos, mais paciência ainda. As máquinas que perfuram o solo são barulhentas e param somente porque os funcionários precisam manter suas necessidades fisiológicas em dia. Nesta fase, porém — e é justamente este o argumento que me permite compreender os tuntuns — , operários estão a construir aquilo que, no futuro, dará sustentação ao prédio: o suporte. (…) E, reflitamos, se, por obra do acaso ou da incompetência do malformado engenheiro, o prédio não se apoiasse sobre um suporte, nada seria. Como um palito, que não pára em pé quando não está fincado num pedaço de carne ou queijo, o prédio ficaria  a cambalear a qualquer condição. Cairia, decerto, quando atingido por fortes rajadas de vento, ou nem tão fortes assim, ultimamente bastante comuns aqui em Guarulhos. Não seria, portanto, um prédio, mas todo entulho.

Muito embora haja íntima afeição entre mim e a ideia de vê-la plantada à frente da tela de um moderno computador escrevendo tal biografia, meu sentimento acerca dessa vontade que ela tem de publicá-la é de repúdio. (…) O prédio não se vende pelo suporte ou, entende-se melhor, pelo buraco que o sustenta, mas por tudo aquilo que é construído sobre tal buraco. Vendem-se os apartamentos, suspensos, mas não se vende o buraco. Aliás, não se vende sequer o porão que se constrói naquele pedaço; muito pelo contrário, enche-se de carros e poeira. (…) Minha querida Mãe é o suporte da família.

Ficaríamos aqui, a cambalear, se ela não estivesse presente. E cambalearíamos quando a falta de paciência tomasse conta do ser, quando o bom arroz e feijão materno nos faltassem ou quando, ainda que por um lapso, deixássemos de entender que a família, sob a égide da mãe, é a base que sustenta todo o resto. E é assim que funciona com Odorica Aureliana Girarde, minha querida Mãe: está a todo o momento, paciente como só ela, equalizando o patriarca, suportando tudo e todos como a pedra fundamental de uma obra. Sua serenidade, poucas vezes quebrada, é que dá o tom. Seu legado, aí sim, aparece sob a forma de um importante papel.

Se não pelo duvidoso lucro com as vendas, minha mãe não precisa de uma biografia editada e publicada. Aos 63 anos, completos hoje, ela pode se encher de orgulho, o bom, ao dizer que, sim, sustenta todo o amor necessário a uma família. E o faz como todo trabalho que se emprega antes da construção de um prédio; ela o faz como toda boa e exemplar mãe. Seu legado e seu sorriso, esses sim, não morrerão em nossos corações. E que dure por anos e mais anos, assim como duram os patrimônios históricos  que há tanto tempo estão por aí, em pé, fincados sobre (…) um suporte.

Obrigado, amada Mãe. Feliz aniversário.

Eu te amo!

A conta da sua vida

 

 

Se pudéssemos precificar, quanto custaria uma hora de sua vida? Você a venderia a outro por um preço módico? E se levássemos em conta as horas em que fica dormindo, assistindo aos programas da televisão, divertindo-se com seus familiares ou em horários de lazer? Quanto valeria tudo isso? De tempos para cá, muitos estudos sobre o modo por meio do qual as pessoas alocam o tempo de suas vidas vêm sendo realizados. Analisemos. Reflitamos.

Um dos artigos mais completos que encontrei sobre o tema foi escrito em Chicago no ano em que nasci — 1981 — com o título The Use of Time: An Integrated Conceptual Model. Nele, os autores Laurence Feldman e Jacob Hornik afirmam que a natureza finita do tempo requer, necessariamente, que o indivíduo faça boas escolhas conforme sua percepção de utilidade. Resumindo: o tempo é curto e a vida, danadinha, desenhada pelas escolhas que fazemos. Essas escolhas, por sinal, dizem esses caras, podem ser classificadas em dois grupos: o grupo de trabalho (work) e o outro, oposto, sem tradução literal, de não-trabalho (nonwork). O primeiro grupo — de trabalho — possui uma atividade somente: o emprego. Já o segundo, três atividades: (1) as necessidades, (2) o trabalho que se faz em casa e o (3) lazer.

O emprego é o tempo pago, geralmente por outros, capaz de fazer com que o indivíduo abasteça sua casa, tenha dinheiro para sair com amigos, compre presentes de Natal ou aquelas tralhas que enfia no apartamento, por sinal também comprado com o tal dindim. É a prata, a moeda de troca. (…) As necessidades, tais como comer, dormir, etc…, são atividades constantes de auto-manutenção. Aliás, como não poderia deixar de ser, o tempo gasto em atividades desse tipo são relativamente constantes; afinal, não se espera que alguém fique muito tempo sem almoçar, sem cair no sono ou ir ao banheiro, não é mesmo? (…) O homework — ou melhor, o trabalho feito em casa — pode (ou não) ser remunerado e rouba um tempinho. É aquele no qual o indivíduo trabalha porque se sente obrigado (como acontece quando leva o resíduo de tarefas não-cumpridas do emprego ou da faculdade para casa) ou porque vê nele uma alternativa financeira ao emprego (como acontece no caso da professora que, mal remunerada, enrola coxinhas em casa e vende às centenas). (…) Por fim, o lazer — tempo destinado ao entretenimento em que o indivíduo está livre de compromissos e/ou responsabilidades. É, na verdade, o momento mais esperado por muitos, geralmente destinado aos passeios no shoppings, ao sol da praia, à TV ou ao consumo de final de semana.

Agora, façamos a conta.

Imaginemos um ser humano comum, habitante de São Paulo: 8 horas de sono (necessidades), mais 8 horinhas no trabalho (emprego) e, por fim, 8 livres (lazer ou homework). 1/3 para cada bloco. (…) Bom, imaginemos também que esse indivíduo — comum — esteja há 10km do trabalho e, prejudicado pelo trânsito, demore 30 minutos para ir, mais 30 para voltar. 1 hora. E, sendo assim, como não pode excluir 1 hora do bloco emprego, vai infeliz a diminuir 1 hora de seu tempo livre OU de seu sono. O emprego, nesse caso, ganharia uma hora.

Na nova conta — e levando em consideração que a hora no trânsito tenha sido supostamente alocada no bloco de tempo livre — , teríamos um indivíduo com 9 horas destinadas ao emprego, 7 horas livres e 8 horinhas para as necessidades básicas. (…) Mas e a HORA do almoço no trampo? E aquela outra horinha destinada ao banho, às vestimentas, ao café da manhã e, no caso das mulheres, à maquiagem? Muito embora estejam, na prática, relacionadas ao bloco de necessidades, todas essas atividades estão voltadas exclusivamente ao emprego. É como se existisse — e existe! — uma espécie de ritual de preparação para o trabalho. Mais 2 horas para ele.

Na prática, de segunda a sexta-feira, 12 horas da vida são destinadas ao trabalho. Metade de todo um dia. E aí, se pensarmos que uma semana tem 168 horas,  estamos falando de 36%, ou seja, mais de um terço de TODO o tempo de uma semana destinada ao emprego. 60 horas. Então somamos a isso as 7 horas, em média, de sono diário — mais 29% vão embora! — e temos 65% do tempo total. Resumindo: dos 365 dias de um ano, aproximadamente 234 são destinados exclusivamente ao emprego e ao sono. Quase 8 meses!

Ah, e supondo ainda que o indivíduo não esteja tão satisfeito com seu emprego, seria como se vendesse 8 meses de todo um ano (ou pior, 2/3 da vida) para alguém, para uma empresa, e ainda assim não fosse feliz. O pior: tem gente que se aposenta nessa vidinha. #VDM É TODA UMA HISTÓRIA!

(…)

Quanto custa uma de suas horas? Você a vende por um preço módico?
Reflita. Faça as contas.

Antipaquito antipático

 

 

Não fazia parte do universo de garotos que, lá por volta dos anos 90, sonhava em ser paquito. Hah, pensando bem, eu nem poderia. Os caras eram loiros, alguns tinham um estilão meio metrossexual e outros, imagine só, cultivavam madeixas que deixariam Xororó e Zezé di Camargo com uma baita inveja. Blérgh, não sei o que é pior. (…) Aliás, falando nisso, esta reportagem [link] noticia de modo cômico o atual paradeiro dos pupilos de Xuxa Meneghel. Ish, andam tão gordos quanto sanduíche de mortadela! Era de se esperar.

Não sonho em ser paquito ao gosto antigo. Quer saber? Sequer ao moderno.

Hoje, vê se pode, os neopaquitos já não têm cabeleiras empapuçadas em laquês Karina, são menos andróginos que os originais e não se importam tanto assim com a maquilagem que esconde o rostinho suave, pálido e afeminado. A nova geração de paquitos é diferente: usa óculos da moda, pomada nos cabelos, gola engomada e desfila roupas descoladas — numa expressão fútil de gente do tipo rica. Tipo R. Na embalagem, braços e abdômens torneados; no âmago, uma vontade insaciável de devorar fêmeas. (…) Conquistador. Pai d’égua. Grito da moda.

À luz daquela época, anos 90, comumente armavam-se alvoroços às margens desses garotos. Hoje, nenhuma mudança; a saga continua.

Jovens mulheres, muito embora classifiquem os bons homens como raros, continuam à caça de paquitos do tipo R. Debatem copiosamente em rodas de bar, discursam sobre a ética do amor, dizem sonhar acordadas com o casamento e os relacionamentos duradouros, mas vivem lambendo beiços de paquitos por aí. E sofrendo as consequências, claro. (…) No final das contas, o balanço — contraditório, por sinal — não bate: sobram homens bons e faltam os paquitos.

O problema fundamental cerca o fato de que o homem verdadeiramente bom geralmente não usa óculos da moda, pomada nos cabelos, gola engomada e não desfila em roupas prafrentex. O raro, dito procurado, não tem braços torneados e no fundo, bem lá no fundo do ser, ao invés de simplesmente devorar crua, vive para oferecer amor puro à sua amada. De procurado, coitado, o homem raro não tem nada. Mentira das mulheres. Procurados são os neopaquitos, esses sim.

Busco, dia após dia, uma mulher rara na qual possa depositar todos os bons sentimentos que tenho a oferecer. Meu nome é Willian Girarde, sou antipático, antipaquito e, apesar de me sentir atraído por loiras, não procuro uma paquita da Xuxa.

Eu só quero amar. Só quero amar.

 

amor de Passarinho

Prometo ser fiel na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, amando-lhe e respeitando-lhe até que a morte nos separe. Pá! Pá! Pá!

Falar de amor enjoa, enoja às vezes. Às vezes, confesso, falar de amor é como acreditar na maior, seja lá qual for, utopia dos tempos. O amor, digo o vivido hoje, em letra minúscula, enobrece o ego ao invés do matrimônio, a beleza do corpo nu ao invés da beleza da alma, a bonança eterna ao invés do eterno felizes para sempre. É um amor falso. Fake. (…) Falar de amor, sendo assim, é motivo para chacotas corpulentas e, ainda que saia por acaso, é geralmente voz de fora para dentro, não mais de dentro para fora. E quando felizmente é de dentro para fora, reitero, vira motivo de chacota. Então, triste, o antes-crente passa a afogar a humilhação do tentar amar inebriando-se em festas do beija-beija, no te amo a preço de banana, em traição da própria consciência e nos infundados discursos — e somente discursos — de boa família e amor eterno, na saúde ou na doença. Mentira. Excetos em raros casos, hoje só o amor da arara é assim. (…) E todo esse vazio do existir nos faz esquecer que, ainda que falássemos as línguas de homens e anjos, tivéssemos toda a fé e o dom da profecia, que conhecêssemos todos os mistérios e toda a ciência, sem o Amor nada seríamos. Nada somos. Faz-nos esquecer também que, ainda que distribuíssemos toda nossa fortuna para sustento dos pobres e entregássemos nossos corpos para uma churrascada de canibais, sem o verdadeiro Amor, nadinha. (…) E quer saber? O Amor verdadeiro é paciente, é benigno; o Amor não é invejoso, não trata com leviandade, não se ensoberbece, não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal, não folga com a injustiça, mas folga com a verdade. Tudo tolera, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O Amor nunca falha. (…) Somos nós, minha gente, que deixamos de viver o verdadeiro.

Eu acredito no Amor.